Por: Alfredo Bellini
Artigo Revista Cura
Traduzido por: Aline Salla

O Alzheimer: o estigma da demência

O Alzheimer causa medo mesmo antes de se manifestar e é uma doença temida porque ainda não se sabe como curá-la. Esse modo de pensar, no entanto, gera um forte sentimento de isolamento tanto na pessoa que precisa de cuidados quanto em quem assume a responsabilidade pela assistência. Ao estigma social frequentemente se soma uma linguagem negativa que reduz as pessoas com a doença a uma série de rótulos, sintomas ou termos médicos.

Alzheimer: a origem do estigma

O estigma social é um dos maiores obstáculos para as pessoas com Alzheimer ou demência que tentam viver suas vidas com dignidade, apesar do avanço inevitável e progressivo da doença. A demência, uma das consequências do Alzheimer, é percebida pela sociedade apenas como sofrimento — algo a ser temido, afastado, evitado — assim como acontecia com o câncer há quarenta anos.

Uma possível explicação para essa atitude de rejeição está ligada à tendência inata do ser humano de sentir medo daquilo que é diferente. Sua reação mais instintiva diante do medo é o ataque, com o objetivo de eliminar a causa desse medo. É nesse contexto de ignorância e egoísmo que a pessoa com demência se vê obrigada a viver — ou melhor, a sobreviver. A pessoa com perda de memória não é apenas penalizada por esse hábito deplorável do ser humano de estigmatizar minorias e aquilo que não conhece, mas também sofre com a desinformação generalizada, o que agrava ainda mais a situação.

Certamente é verdade que todo ser humano teme tornar-se frágil e dependente dos outros, e esses medos são particularmente profundos onde o senso de comunidade é mais fraco. Além disso, o medo do esquecimento e da morte é muito presente. Tudo isso, porém, influencia a relação de cuidado com aqueles que são idosos, frágeis e vulneráveis. A demência tem o poder de ativar esses medos e, por isso, estar próximo de uma pessoa com demência pode representar, para a nossa imaginação, uma antecipação aterrorizante de como poderíamos nos tornar. Esse modo de pensar transforma quem sofre de demência em um membro de uma espécie diferente.

Um estudo realizado na Inglaterra revelou que existem, principalmente, três crenças e modos pelos quais essa dinâmica do estigma se desenvolve.

A primeira diz respeito à suposta incapacidade da pessoa com demência de responder ao contato humano; o segundo aspecto se refere à dificuldade da pessoa em manter seu papel social e contribuir nas interações com o ambiente externo; o terceiro ponto trata da percepção de que pessoas com demência são incapazes de retribuir aquilo que recebem e, por isso, são vistas como um peso para a sociedade.

Segundo o relatório “Superar o estigma da demência”, publicado em 2012 pela Alzheimer’s Disease International, uma em cada quatro pessoas com demência esconde seu diagnóstico devido ao estigma que envolve a doença, e 40% dos pacientes relatam não se sentirem aceitos na vida cotidiana.

Diferentes tipos de estigma relacionados ao Alzheimer

Há diferentes formas de estigma que afetam as pessoas com demência e seus familiares:

Estigma público
Refere-se às opiniões ou crenças negativas da sociedade em geral, que levam à discriminação contra pessoas com demência e seus familiares. Às vezes, esse estigma pode ser sutil, não muito evidente, manifestando-se em pensamentos rígidos e julgamentos sobre as pessoas com demência, vistas como incapazes ou inferiores.

Autoestigma
As próprias pessoas com demência podem interiorizar os estereótipos negativos sobre sua condição. Podem sentir vergonha ou inferioridade, o que muitas vezes leva à depressão, ao isolamento e à baixa autoestima.

Estigma secundário
Também chamado de “estigma de recaída”, atinge familiares e cuidadores, que podem desenvolver as mesmas consequências emocionais das pessoas com demência, como estresse, depressão e isolamento.

Os efeitos do estigma

Mas quais são as consequências do estigma para as pessoas com demência e seus familiares? Vejamos algumas:

Muito frequentemente, as pessoas com demência também vivenciam sentimentos de vergonha, pois a demência é associada a termos como “louco”, “doente mental”, “pessoa que não entende”. Além da vergonha, muitas pessoas com demência sentem culpa por terem desenvolvido a doença, como se fosse responsabilidade delas estarem se tornando um fardo para seus entes queridos. Podem dizer a si mesmas coisas como: “Eu deveria ter cuidado melhor de mim” ou “Se ao menos eu tivesse me exercitado mais, feito mais atividades físicas e melhorado meu estilo de vida, agora eu não estaria assim”.

Outro sentimento emocional recorrente é o de isolamento e abandono. Um diagnóstico de Alzheimer coloca à prova amizades e vínculos afetivos. Às vezes, os amigos se recusam a acreditar no diagnóstico e, como consequência, se afastam. As relações familiares também podem mudar. Com o diagnóstico de demência, todo o sistema familiar frequentemente entra em crise. Os familiares podem evitar falar abertamente sobre a doença e até evitar interações com a pessoa com demência por não saberem como lidar ou o que dizer.

Esse sentimento de isolamento também é vivido quando, como muitas vezes acontece, os familiares preferem falar com a cuidadora ou com o profissional de saúde responsável, sem perguntar diretamente à pessoa com demência, por exemplo, como ela está ou do que precisa.

Outra consequência do estigma é a dificuldade que famílias e cuidadores enfrentam para pedir ajuda, o que piora a situação da pessoa com demência e causa atrasos no diagnóstico.

O medo da discriminação, da perda de autonomia e da exclusão pode impedir que quem apresenta sintomas procure um diagnóstico profissional.

O estigma e a falta de conscientização também afetam a pesquisa sobre a doença de Alzheimer. A maioria dos países financia a pesquisa sobre o Alzheimer em níveis inferiores aos destinados a outras doenças, mesmo quando o custo do cuidado com o Alzheimer é significativamente mais alto.

Os desejos das pessoas com demência

As pessoas com demência possuem uma dignidade que deve ser respeitada e protegida. Elas desejam ser tratadas como pessoas normais, querem ser vistas por suas habilidades preservadas e não apenas por suas limitações.

Uma pessoa com Alzheimer ou demência mantém a capacidade de sentir emoções, continua sensível ao toque delicado de alguém querido, é capaz de se expressar de diferentes formas e – especialmente nas fases iniciais – pode continuar realizando algumas atividades “procedurais”, como cozinhar, dirigir, andar de bicicleta, tricotar. Atividades como essas, quando incentivadas com carinho pelo cuidador, tornam-se oportunidades únicas para que a pessoa se sinta ainda viva e capaz de explorar o seu mundo.

Sugestões para superar o estigma sobre as pessoas com Alzheimer

É fundamental estabelecer uma forte rede de apoio com comunicação aberta nas fases iniciais após o diagnóstico de Alzheimer, para proporcionar às pessoas com demência maior autonomia nos processos de tomada de decisão. Isso ajuda a prevenir sentimentos de impotência e frustração por não serem ouvidas.

Torna-se, portanto, urgente a necessidade de criar uma rede entre os diversos atores envolvidos no cuidado, numa perspectiva de integração possível entre médicos, psicólogos, profissionais de saúde, instituições e, sobretudo, os familiares, que desempenham um papel fundamental. De fato, a progressão da doença envolve inevitavelmente a família no cuidado, na assistência e na proteção da pessoa com demência.

Para alcançar esse objetivo, é necessário oferecer mais apoio e formação aos cuidadores familiares, voluntários e profissionais, além de melhorar a qualidade da assistência domiciliar e nas instituições de longa permanência.

No plano social, a demência deveria ser “normalizada”, ou seja, tratada, assim como outras deficiências graves, como parte da condição humana comum. Também seria essencial aumentar a conscientização da opinião pública sobre os direitos das pessoas com demência e saber comunicar informações adequadas sobre a doença.

About the Author: Editorial Revista Cuidar

Edição Internacional

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O Alzheimer: o estigma da demência

O Alzheimer causa medo mesmo antes de se manifestar e é uma doença temida porque ainda não se sabe como curá-la. Esse modo de pensar, no entanto, gera um forte sentimento de isolamento tanto na pessoa que precisa de cuidados quanto em quem assume a responsabilidade pela assistência. Ao estigma social frequentemente se soma uma linguagem negativa que reduz as pessoas com a doença a uma série de rótulos, sintomas ou termos médicos.

Alzheimer: a origem do estigma

O estigma social é um dos maiores obstáculos para as pessoas com Alzheimer ou demência que tentam viver suas vidas com dignidade, apesar do avanço inevitável e progressivo da doença. A demência, uma das consequências do Alzheimer, é percebida pela sociedade apenas como sofrimento — algo a ser temido, afastado, evitado — assim como acontecia com o câncer há quarenta anos.

Uma possível explicação para essa atitude de rejeição está ligada à tendência inata do ser humano de sentir medo daquilo que é diferente. Sua reação mais instintiva diante do medo é o ataque, com o objetivo de eliminar a causa desse medo. É nesse contexto de ignorância e egoísmo que a pessoa com demência se vê obrigada a viver — ou melhor, a sobreviver. A pessoa com perda de memória não é apenas penalizada por esse hábito deplorável do ser humano de estigmatizar minorias e aquilo que não conhece, mas também sofre com a desinformação generalizada, o que agrava ainda mais a situação.

Certamente é verdade que todo ser humano teme tornar-se frágil e dependente dos outros, e esses medos são particularmente profundos onde o senso de comunidade é mais fraco. Além disso, o medo do esquecimento e da morte é muito presente. Tudo isso, porém, influencia a relação de cuidado com aqueles que são idosos, frágeis e vulneráveis. A demência tem o poder de ativar esses medos e, por isso, estar próximo de uma pessoa com demência pode representar, para a nossa imaginação, uma antecipação aterrorizante de como poderíamos nos tornar. Esse modo de pensar transforma quem sofre de demência em um membro de uma espécie diferente.

Um estudo realizado na Inglaterra revelou que existem, principalmente, três crenças e modos pelos quais essa dinâmica do estigma se desenvolve.

A primeira diz respeito à suposta incapacidade da pessoa com demência de responder ao contato humano; o segundo aspecto se refere à dificuldade da pessoa em manter seu papel social e contribuir nas interações com o ambiente externo; o terceiro ponto trata da percepção de que pessoas com demência são incapazes de retribuir aquilo que recebem e, por isso, são vistas como um peso para a sociedade.

Segundo o relatório “Superar o estigma da demência”, publicado em 2012 pela Alzheimer’s Disease International, uma em cada quatro pessoas com demência esconde seu diagnóstico devido ao estigma que envolve a doença, e 40% dos pacientes relatam não se sentirem aceitos na vida cotidiana.

Diferentes tipos de estigma relacionados ao Alzheimer

Há diferentes formas de estigma que afetam as pessoas com demência e seus familiares:

Estigma público
Refere-se às opiniões ou crenças negativas da sociedade em geral, que levam à discriminação contra pessoas com demência e seus familiares. Às vezes, esse estigma pode ser sutil, não muito evidente, manifestando-se em pensamentos rígidos e julgamentos sobre as pessoas com demência, vistas como incapazes ou inferiores.

Autoestigma
As próprias pessoas com demência podem interiorizar os estereótipos negativos sobre sua condição. Podem sentir vergonha ou inferioridade, o que muitas vezes leva à depressão, ao isolamento e à baixa autoestima.

Estigma secundário
Também chamado de “estigma de recaída”, atinge familiares e cuidadores, que podem desenvolver as mesmas consequências emocionais das pessoas com demência, como estresse, depressão e isolamento.

Os efeitos do estigma

Mas quais são as consequências do estigma para as pessoas com demência e seus familiares? Vejamos algumas:

Muito frequentemente, as pessoas com demência também vivenciam sentimentos de vergonha, pois a demência é associada a termos como “louco”, “doente mental”, “pessoa que não entende”. Além da vergonha, muitas pessoas com demência sentem culpa por terem desenvolvido a doença, como se fosse responsabilidade delas estarem se tornando um fardo para seus entes queridos. Podem dizer a si mesmas coisas como: “Eu deveria ter cuidado melhor de mim” ou “Se ao menos eu tivesse me exercitado mais, feito mais atividades físicas e melhorado meu estilo de vida, agora eu não estaria assim”.

Outro sentimento emocional recorrente é o de isolamento e abandono. Um diagnóstico de Alzheimer coloca à prova amizades e vínculos afetivos. Às vezes, os amigos se recusam a acreditar no diagnóstico e, como consequência, se afastam. As relações familiares também podem mudar. Com o diagnóstico de demência, todo o sistema familiar frequentemente entra em crise. Os familiares podem evitar falar abertamente sobre a doença e até evitar interações com a pessoa com demência por não saberem como lidar ou o que dizer.

Esse sentimento de isolamento também é vivido quando, como muitas vezes acontece, os familiares preferem falar com a cuidadora ou com o profissional de saúde responsável, sem perguntar diretamente à pessoa com demência, por exemplo, como ela está ou do que precisa.

Outra consequência do estigma é a dificuldade que famílias e cuidadores enfrentam para pedir ajuda, o que piora a situação da pessoa com demência e causa atrasos no diagnóstico.

O medo da discriminação, da perda de autonomia e da exclusão pode impedir que quem apresenta sintomas procure um diagnóstico profissional.

O estigma e a falta de conscientização também afetam a pesquisa sobre a doença de Alzheimer. A maioria dos países financia a pesquisa sobre o Alzheimer em níveis inferiores aos destinados a outras doenças, mesmo quando o custo do cuidado com o Alzheimer é significativamente mais alto.

Os desejos das pessoas com demência

As pessoas com demência possuem uma dignidade que deve ser respeitada e protegida. Elas desejam ser tratadas como pessoas normais, querem ser vistas por suas habilidades preservadas e não apenas por suas limitações.

Uma pessoa com Alzheimer ou demência mantém a capacidade de sentir emoções, continua sensível ao toque delicado de alguém querido, é capaz de se expressar de diferentes formas e – especialmente nas fases iniciais – pode continuar realizando algumas atividades “procedurais”, como cozinhar, dirigir, andar de bicicleta, tricotar. Atividades como essas, quando incentivadas com carinho pelo cuidador, tornam-se oportunidades únicas para que a pessoa se sinta ainda viva e capaz de explorar o seu mundo.

Sugestões para superar o estigma sobre as pessoas com Alzheimer

É fundamental estabelecer uma forte rede de apoio com comunicação aberta nas fases iniciais após o diagnóstico de Alzheimer, para proporcionar às pessoas com demência maior autonomia nos processos de tomada de decisão. Isso ajuda a prevenir sentimentos de impotência e frustração por não serem ouvidas.

Torna-se, portanto, urgente a necessidade de criar uma rede entre os diversos atores envolvidos no cuidado, numa perspectiva de integração possível entre médicos, psicólogos, profissionais de saúde, instituições e, sobretudo, os familiares, que desempenham um papel fundamental. De fato, a progressão da doença envolve inevitavelmente a família no cuidado, na assistência e na proteção da pessoa com demência.

Para alcançar esse objetivo, é necessário oferecer mais apoio e formação aos cuidadores familiares, voluntários e profissionais, além de melhorar a qualidade da assistência domiciliar e nas instituições de longa permanência.

No plano social, a demência deveria ser “normalizada”, ou seja, tratada, assim como outras deficiências graves, como parte da condição humana comum. Também seria essencial aumentar a conscientização da opinião pública sobre os direitos das pessoas com demência e saber comunicar informações adequadas sobre a doença.

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One Comment

  1. Danielle 12/06/2025 at 06:25 - Reply

    Achei o artigo ótimo!! Vou recomendar a leitura.
    Sou fonoaudióloga, doutora em reabilitação e cuidado paliativo, e posso colaborar com disfagia e comunicação.

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